

nove
escritos
Em setembro de 2025 escrevi cerca de 46 textos.
Escolhi nove para partilhar aqui.
NORNAS.
Teias de aranha, tecem sem manha.
É manhã e elas não se foram ainda.
"As Nornas são três anciãs da mitologia nórdica que tem como função tecer o destino dos deuses e homens.
Urð (passado) é muito velha e vive olhando para trás, por sobre os ombros.
Verðandi (presente) é uma mulher madura e olha sempre para o presente
e Skuld (futuro), vive encarapuçada e possui um pergaminho fechado sobre seu regaço,
que contém os segredos do futuro."
FONTE: https://pt.wikipedia.org/wiki/Nornas
Texto 1:
Humanos têm uma coisa com coisas mortas...
Amamos as estrelas e a gente vê delas só um rastro de algo que já está morrido.
Eu mesmo amo observar estrelas até porque onde passo maior parte do meu tempo, elas são encobertas com camadas de fumaça e apagadas por luzes artificiais.
Fico olhando as estrelas agora… Incontáveis! Por onde meu olho (sem óculos pelo momento) passa, aparecem ainda mais e mais.
E mais. Essa eu já contei? Essa aqui, logo ali, eu não tinha visto.
O que será meu que morreu
que brilha para os outros.
Estar vivo seria isso? Um grande nada encoberto pelo brilho do que é nosso e já morreu?
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Cheguei
Cheguei com a primavera
me vou antes dela acabar.
Comprei algumas velas
pra santos abençoar.
O céu está quente demais.
Na TV? Queimadas vivais.
Oh, o entorno como meu interior.
Não merecia isso,
seja qual pecado for.
Ih, sente o vento suave.
Sem cheiro de chuva
devo pegar uma nave?
Ou me deixo virar pururuca?
Ah, a água gelada pelo cano.
Lava a alma e explana.
Não dá pra passar pano,
quem é você que chama?
Chama de chamar,
chamiscar de indendiar.
Quem somos nós?
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Há algo que só eu sei.
Debaixo de mares, sobre a copa de árvores, dentro da raíz, do lado esquerdo da luz debaixo que entra pela lateral.
Com gosto do cheiro do barulho, há algo que só eu sei.
Embaixo de pisos fixos com argamassa, do lado direito do poro do rejunte dentro da falta de luz do canto direito-esquerdo daquele quarto opaco demais.
Há algo que só eu sei.
Algo esse que talvez você saiba.
Há algo que só nós sabemos?
Pelos poros dos rastros das serpentes de livros mais antigos que eu, com histórias de coisas que vão acontecer depois de mim.
As páginas sabem que você sabe que sob e dentro dos poros nada macios de algo nada humano, se sabe que não sabem o que suspeitam que sei que sabem.
Fora do orvalho, há algo que só eu não sei, que é algo que só você sabe que não sabe que já estava sabendo.
Havia algo.
Agora mesmo.
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Serpente de Ouroboros.
Assim, quando se apagam as luzes do ônibus que eu estou,
fica mais claro no ouvido. Os sons tornam outras proporções quando estamos distantes de alguma luz direta.
Quanto menos luz, mais o som irradia de forma que se faz pensar
o que se faz pensar?
Coincidentemente com o meu botão apagando a luz do ônibus, o som de serpente se tornou mais nítido.
Já devo estar na quarta, vigésima ou alguma muito repetida nuance do mantra que toca. Deveriam ser só flautas, mas há sons ocultos.
Sempre há
sons ocultos.
Coloquei alguns no meu próprio mantra que fiz há tempos atrás.
Mas estamos falando desse. O chacoalhar triplo, suave como que dentro de nossas cabeças. Uma serpente.
Aposto que ela come o próprio rabo enquanto o chacoalha.
Serpente de Ouroboros. Essa é a serpente que come a própria cauda.
Mas penso que estamos pensando errado. Mesmo com a cauda em sua boca, ou sua boca cheia de sua cauda, ela continua algumas vezes à chacoalhar e chacoalhar e chacoalhar. Penso até que são 3
Três sutis chocalhos. Só pra se lembrar ela própria que a ponta do rabo está ali.
Até pra inclusive fazer com que a digestão continue e não pare. Continue a engolir o chocalho.
Não pare de engolir o chocalho.
Chocalho terceira vez
Pra se dizer presente.
Não
Pare,
Serpente.
Ela não para de rodar. Mas alguém para isso.
Só não devo ter chego no capítulo ainda.
(De Ouroboros)
as pessoas falam bastante
eu mesmo, me julgo uma pessoa que fala demais.
ao longo do meu pouco tempo nessa vida que estou, percebi que as pessoas falam por falar
ou falam depois do que acabaram de falar
falam o que não querem ouvir
e falam pros outros ouvirem
o que quer que elas queiram
As pessoas falam muito, com a sua voz,
estou falando desse ato mesmo, de falar.
Elas falam de uma forma que elas precisam
que outras pessoas escutem.
Falam nomes e coisas que acham
E achando muito ou nada
Ficam falando.
Eu já tive mais paciência pra ouvir
as tantas e tantas falas que elas
e eles tem pra falar.
Escutam e discutem entre si
em uma língua que só elas escutam.
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Se eu tivesse ido embora quando pensei que iria, sinto que as coisas estariam como estão. As coisas rodariam ou empacariam ou acelerariam sem mim. Sem eu, as coisas fluiriam e enroscariam e seguiriam sendo as coisas.
O céu continuaria tendo as nuances de cores que ele tem. As ondas do mar continuariam seguindo a Lua, fiéis companheiras.
O som se mutaria e aumentaria. As pessoas falariam e as pessoas enxergariam
e observariam
e seriam
pessoas.
O quente do sangue do meu corpo não atrairia as mosquinhas de hoje. Mas elas encontrariam seu caminho até algo com sangue quente.
Que até poderia estar sentado onde estou.
O lugar que me sustenta sustentaria dois, três, cinco. Ou nenhuma.
Se eu tivesse ido embora, tudo seria totalmente diferente sendo totalmente idêntico ao que se é.
Eu não fui.
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Imploro tanto pra não ser visto.
Engulo meu espirro.
Repito uma roupa de propósito.
Falo baixo, atravesso a rua.
Desde que me entendo por ser algo,
não gosto do fato de falar muito.
Quando mais que 3 pessoas olham pra mim,
Nossa. Um absurdo.
Já pedi pra lua me tornar invisível.
Senti ela rindo lá de cima.
E ela parecia mesmo um meio sorriso.
Ela fez foi nada, ou fez tudo que pedi.
Implorei pro sol me tornar cinza.
Cor mais triste, que eu saiba, não existe.
Aí me dei conta que cinza na verdade é
toda e cada cor, em preto e branco.
E com um toque de cor me vi sépia.
E em sépia a urgência era sumir.
Entenderam errado o recado
De quebra quase ofereço meu antebraço
Só pra não ser visto nas ruas e bosques.
Me pergunto o por quê.
Mas, sinceramente, quero nem saber.
Ficar invisível, aprendi com as estrelas,
só as vezes que é possível.
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Um sol de rachar a cuca.
Temos hoje um sol que me faz vir a mente a voz de alguns alguéns conhecidos falando:
-Hoje está um sol de rachar a cuca.
Dos folclores de quando eu era pequeno ficou pouca coisa em meu coração e mente. Cuca era uma feiticeira da floresta. Sim, na minha época de pequeno ela tinha formato reptiliano era amparada por borboletas em uma releitura criada décadas depois e que chegou ao meu conhecimento.
Aposto que Cuca Feiticeira não racha nesse Sol.
Mas, penso eu, cabeças cucas como a minha, que já estão rachadas, o Sol racha ainda mais elas? Ou nada acontece? Duvido muito dessa segunda hipótese, afinal, e O DEUS SOL.
Se ele toca até queimar, penso que é sirene. Não sirene de ambulância. Nem sirene de polícia. Sirene pra Shiva. Ele/ela aparece (imagino que de forma majestosa) e o fogo… Nada fica igual perante o fogo e Shiva se nutre disso.
Fogo nessas cucas. Há rachaduras na minha e na sua. Não é só uma caixa de ossos. Nossa, agora esse Sol rachou mesmo minha cuca. Sinto a presença de Shiva.
Em minha frente queimando arbustos que cegam meu caminho. Oh, Lord Shiva.
Sob meus pés dançando de forma que tudo trema e eu sinta alguma direção.
Dos meus lados com aros de fogo e serpentes agitadas que passam por dentro de mim, do meu lado direito
para o esquerdo
para o meu direito
para o meu oposto.
Silenciosas e potentes serpentes. Abocanham tudo que passa pelos meus lados.
E, principalmente, em cima de mim.
Ah, Lord Shiva.
Sobre mim, absorvendo toda energia do deus Sol e criando algo em formato que nem consigo…
Shiva, Shiva, Shiva
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Dormentas.
Pensei agora nessa palavra… Dor com tormenta.
Todos chegam, passam e chegam novamente nessas.
Só para passar mais uma vez.
Largar tudo para pegar uma caneta e escrever é algo… Algo tão banal quanto respirar, eu sei.
Li que bruxas sabem a hora de parar.
Sei que elas sabem a hora de continuar.
Quando se pega um papel e uma caneta, se sai muito ou nada. Eu mesmo tenho dias que prefiro apreciar um papel e suas linhas todas em branco do que as preencher com o que for.
Minha DORMENTA.
Não é sobre escrever, mas sobre ler e reler e selecionar o que vai para o mundo (e o que morre comigo).
Mas, o que o mundo quer ler?
Deveria pensar nisso na hora de escrever, mas não o faço.
Talvez por isso meus garranchos sejam só mais alguns. Pode ser que por isso, seja o oposto.
Que dormenta…
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Se a Deus existe,
não adeus de até nunca mais,
mas Deus de, você sabe,
se isso existe, o que isso vê lá de cima?
pássaro no lixo. Tem essa expressão
que eu já ouvi muitas vezes:
“Tá que nem pássaro no lixo”.
Estava eu agora pouco
como pássaro num céu de estrelas.
Nem sei se deveria usar essa expressão,
pássaros reparam nas estrelas?
(até hoje nenhum me respondeu)
Estava eu, debaixo de um céu
de incontáveis estrelas
que por si só já me é um momento
de “pássaros nas estrelas”.
E pensei brevemente nisso
“Isso que é Deus, vê o que da gente
quando olha lá de cima, bem alto,
lá de cimão?”
Reflexões de um pássaro nas estrelas.

